8. A FAMLÍA E A SOCIEDADE PERMISSIVA

A SOCIEDADE PERMISSIVA TORNA-SE VIOLENTA

 

     Muitos de nós temos a impressão de que o mundo moderno está soçobrando na violência. Em face de tantos atos de pura brutalidade e terrorismo, já nos teremos perguntado a nós mesmos: como pode haver pessoas tão irresponsáveis, tão desprovidas de princípios e tão violentas?

 

     A resposta pode estar parcialmente em nós mesmos. Todos nós somos parcialmente culpados pela violência crescente do mundo em que vivemos, porque toleramos a sociedade permissiva ou até contribuímos para criá-la. A lógica é simples. Uma sociedade permissiva significa uma sociedade que não professa nenhum princípio moral fixo. Este tipo de sociedade gera inevitavelmente uma enorme massa de pessoas irresponsáveis. E quando a maioria das pessoas é irresponsável, uma percentagem cada vez maior deixa-se levar pela violência.

 

     Numa sociedade permissiva, o único princípio restritivo é que a conduta dos indivíduos não deve ser anti-social. Se, com esta ressalva, nada está realmente errado, também não pode haver nada que esteja certo; tudo dependerá das opiniões e das escolhas individuais. E quando os jovens crescem numa sociedade em que lhes ensinam que não há valores morais objetivos e absolutos, mas que tudo é relativo e subjetivo, provavelmente não saberão antepor os interesses da coletividade aos seus caprichos e desejos pessoais.

 

     Quando a massa dos jovens aprende que nada deve ser considerado sagrado, que nada merece um respeito absoluto, a conseqüência lógica é que muitos deles acabem efetivamente por não respeitar nada - nem na esfera pessoal, nem na social: nem propriedade, nem lei, nem liberdade, nem vida. Pouco falta para que se tornem criminosos ou terroristas. E se alguns vão por esse caminho, é porque a própria sociedade que eles desprezam, roubam e aterrorizam os levou a tornar-se terroristas.

 

     Mas a tese de que uma sociedade permissiva cria um clima que fomenta a violência pode ser provada com argumentos mais claros. A permissividade afinal de contas concentra-se principalmente em torno do problema do sexo. E deveria ser óbvio para qualquer pessoa com um mínimo de senso comum que o sexo é uma área da conduta humana carregada de um extraordinário potencial de violência. Não podemos negá-lo, sob pena de não conseguirmos explicar o fenômeno do estupro e outros capítulos da história da criminalidade.

 

     Contrariamente ao que boa parte da propaganda moderna sugere, sexo e amor não são a mesma coisa. Subordinado ao amor e à sua evidente função procriadora, o sexo é uma nobre realidade, dádiva divina, que encontra a sua expressão adequada no amor conjugal. Mas o sexo é o instinto humano mais explosivo e rebelde. Não se submete com facilidade a nenhuma outra coisa. Quando é despertado, quer uma satisfação imediata, e quere-a nos termos que ele próprio fixa, como um fim em si mesmo.

 

     Os paradoxos do ser humano são muitos, e são especialmente intensos no âmbito do sexo. A sexualidade, que, com algum esforço, pode ser integrada na mais nobre das faculdades humanas - a faculdade de amar -, é também capaz - caso não se faça nenhum esforço - de tornar-se uma das expressões mais brutais e violentas do egoísmo [1]. O sexo sem controle é como um animal selvagem. É destruidor. A primeira coisa que destrói, ao buscar-se a si mesmo, é o amor, pois amor e egoísmo são inimigos entre si. E pode destruir muitas outras coisas além disso.

 

O ABORTISMO LEVA AO TERRORISMO

 

     A nossa sociedade permissiva não só diz às pessoas que há pouca ou nenhuma necessidade de controlarem a violência do seus impulsos sexuais, mas tende a cercá-las de estímulos sexuais contínuos. O resultado inevitável é uma onda crescente de violência.

 

     Os filósofos do permissivismo não gostam de falar do elemento violento da sexualidade, embora não sejam tão ingênuos que cheguem a negá-lo. Se os pressionássemos, diriam provavelmente que, embora não ignorem a existência de violência na sexualidade, são contrários ao sexo que impõe violência aos outros, ou seja, contra a vontade deles. Uma sociedade permissiva, portanto, consideraria errado o estupro, mas sustentaria que todas as outras formas de conduta sexual são moral, social e legalmente aceitáveis; seria aceitável, assim, não só qualquer coisa que o indivíduo decida fazer pessoalmente, no âmbito dos seus pensamentos e ações sexuais, mas também o que duas ou mais pessoas - casadas ou solteiras, do mesmo sexo ou de sexo oposto - consintam em fazer juntas.

 

     Mas se submetermos o permissivismo a um exame mais detido, concluiremos que, seja qual for o grau de consentimento, o sexo permissivo sempre infligirá violência a alguém. Na longa lista das "façanhas" permissivas no campo da sexualidade ou da conduta relacionada com o sexo, não é difícil descobrir a violência moral praticada nos casos de adultério: violência contra o direito de um dos cônjuges de esperar lealdade do outro; e mais ainda nos casos de divórcio: normalmente, violência contra um dos cônjuges e com toda a certeza contra os filhos. É normal que os filhos consintam no divórcio? Não é brutal a violência feita ao seu desejo de que a mãe e o pai vivam juntos e saibam entender-se um ao outro? E no caso do aborto - que é assassinar uma criança inocente -, não é inegável que a sua essência reside no máximo de violência física? Legalizar o aborto é legalizar a violência. Uma sociedade que não lute contra os abortistas em breve terá que lutar contra os terroristas. Mas será uma batalha perdida. Pois o terrorismo não pode ser realmente combatido pelo recurso à força policial. Só pode ser combatido mediante a educação das pessoas segundo princípios morais, sobretudo segundo o princípio social fundamental do respeito à vida.

 

VIOLÊNCIA E PORNOGRAFIA

 

     Seja como for, mesmo que passemos por alto estes casos de violência aos outros que a sociedade permissiva fomenta, não há dúvida de que a pessoa que dá rédeas soltas em qualquer circunstância aos seus desejos sexuais, faz violência a si mesma, permite uma violência dentro de si mesma. Esta é a razão essencial por que uma sociedade permissiva leva a todo o tipo de violências. Na medida em que se inculca a idéia de que é perfeitamente correto estimular dentro de si mesmo e procurar satisfazer os violentos impulsos da sexualidade, pode tornar-se progressivamente mais difícil, e eventualmente impossível, convencer as pessoas de que é errado seguir outros impulsos violentos, como o ódio, o desejo de roubar, de matar ou de vingar-se... É inútil dizer a alguém que respeite a sociedade ou respeite os outros, se ao mesmo tempo se lhe diz que não tem nenhuma obrigação de respeitar-se a si próprio.

 

     Aliás, não é só de senso comum dizer que a pornografia leva à violência. Trata-se também, nos dias de hoje, de um fenômeno amplamente documentado. Seria muito bom se todos lessem o terceiro capítulo do Informe Longford sobre a pornografia. Esse capítulo, intitulado "Violência e pornografia", mostra como a pornografia tende cada vez mais a exaltar os aspectos violentos - sádicos ou masoquistas - do sexo; como tem sido conscientemente utilizada como meio de fomentar a violência política (por exemplo, na Alemanha de Hitler) ou a instabilidade social (pensemos na tática marxista nos países ocidentais); e como a pornografia mais brutal - hard core - alimenta o ódio, a agressão e a alienação, e é claramente uma das principais causas da criminalidade e da violência crescentes nas sociedades ocidentais.

 

RETORNO À CENSURA?...

 

     A situação clama, pois, por alguma forma de controle. Com efeito - embora isto me obrigue a usar uma das palavras mais vilipendiadas da nossa linguagem -, eu diria que clama por alguma forma de censura!...

 

     "Censura?", posso ouvir alguns leitores exclamarem com espanto. "Mas será possível que alguém, hoje em dia, seja capaz de defender seriamente a idéia de censura?" Sim, muito seriamente. Mas a censura em que estou pensando provavelmente não é do tipo que o leitor incrédulo tem em mente. Trata-se essencialmente da autocensura a que nos referimos antes. Aliás, todo este assunto merece mais algumas observações.

 

     Sim, sei muito bem que o homem moderno afirma prezar a liberdade como um dos seus maiores bens; e que encara a censura como um dos maiores inimigos tradicionais da liberdade. Sei também que comumente se acredita - ou pelo menos se afirma acreditar - que a abolição progressiva da censura permitiu que milhões de pessoas usufruíssem de uma nova liberdade da qual antes estavam privadas.

 

     Seja-me permitido assegurar ao leitor que eu, ao menos, não desejo privar a massa da população da sua liberdade; muito pelo contrário. Mas sugiro que, embora o que hoje queiramos seja mais liberdade, não é o que estamos conseguindo. O que estamos obtendo é a anarquia sexual, e estamos sendo submetidos à exploração e à escravidão sexual. Nada poderia estar mais longe da liberdade.

 

LIBERDADE E EXPLORAÇÃO

 

     "Liberdade para todos": parece um lema nobre. Mas a história tem demonstrado que a liberdade para todos significa geralmente mais e mais liberdade para os fortes, para os ricos, para os "espertos" e para os inescrupulosos, e cada vez menos liberdade para o resto da humanidade. Significa liberdade para poucos e alguma forma de servidão para muitos.

 

     Há cento e cinqüenta anos, pregava-se com veemência a liberdade absoluta no âmbito da indústria e do comércio. Mas praticamente ninguém a defende hoje em dia. A história do liberalismo econômico e social do século XIX demonstra que umas pequenas minorias, se não encontrarem limitações impostas por alguma forma de controle governamental, tendem a explorar as massas.

 

     Por que nos surpreendemos então se deparamos com um fenômeno similar quando se aplica o princípio liberal da liberdade irrestrita ao âmbito da sexualidade? Certamente, só os muito ingênuos negarão que um dos primeiros resultados da abolição da censura foi transformar a pornografia num grande negócio de multimilionários. Nem é difícil identificar alguns fatores que convertem a pornografia num negócio especialmente grande e lucrativo, e, em conseqüência, entender por que há poderosos interesses econômicos empenhados em manter vivo entre o público o preconceito contra a censura e em sustentar essa fictícia liberdade que ajuda o mercado a prosperar.

 

     Se é possível estimular e depois explorar um apetite artificial como o gosto pelo cigarro, obviamente é muito mais fácil explorar - mediante estímulos prévios - um apetite tão forte e tão natural como o sexo. Os jovens têm uma resistência potencial à compra de cigarros. Como fumar geralmente não dá prazer no início, os fabricantes de cigarros têm de recorrer a outros estímulos; por isso lançam mão da propaganda direta, criando uma atmosfera social que associa o hábito de fumar à virilidade, à maturidade ou à superioridade. O fabricante de pornografia, num certo sentido, tem um público potencialmente mais vulnerável; a pornografia desperta poderosamente os instintos animais do homem. Mas, ao mesmo tempo, é repelida pelo instinto religioso, pela consciência humana e - especialmente no caso da mulher - pelo sentido da modéstia. Estas forças que criam as resistências à comercialização do sexo devem, portanto, ser eliminadas. E eliminam-se pela criação de um clima social em que a libertinagem sexual é chamada liberdade, e o controle sexual é condenado como ultrapassado, puritano, antinatural, inibidor, etc. A propaganda aqui é indireta, mas constitui um verdadeiro fogo de barragem. E vamos encontrar os publicitários desses fabricantes de pornografia - às vezes inconscientes, ou mesmo sem receberem qualquer remuneração - entre os filósofos, os psicólogos, os artistas, os roteiristas, os jornalistas, os políticos...

 

O MERCADO DE ESCRAVOS

 

     Outro ponto importante é que o ideal de qualquer vendedor, em qualquer negócio, é encontrar fregueses regulares, consumidores dependentes. O mercado de cigarros é tão seguro e lucrativo porque gira em torno de compradores cativos. O mesmo se aplica ao das bebidas. Quando o mercado é de drogas ou de sexo, pode-se falar até de compradores escravizados. A exploração de escravos - especialmente quando as pessoas pagam para ser escravas - é um modo infalível de criar fortunas inescrupulosas. E tudo em nome da liberdade!

 

     A exploração torna-se mais óbvia quando nos lembramos de que o sexo comercializado se destina somente aos "trouxas". É uma fraude. À primeira vista, fascina, promete muito; depois dá pouco - uma satisfação que deixa o consumidor insatisfeito.

 

     Na sociedade industrial liberal do século passado, os homens comuns tinham poucas condições de resistir à exploração das suas vidas, mesmo quando queriam fazê-lo. Ou trabalhavam ou morriam de fome. Milhões de pessoas, hoje em dia, são objeto de uma exploração que, pelo menos de um modo geral, não as reduz a ter de viver em cortiços e favelas, que não as oprime materialmente, mas as degrada humana e espiritualmente. É uma exploração infinitamente pior. Contudo, se compararmos a situação atual com a do século passado, é evidente que os homens da sociedade permissiva liberal de hoje podem resistir com muito mais facilidade à exploração, se assim o desejarem. O problema é que muitos aparentemente não o desejam...

 

     No início do capitalismo, do laissez-faire, a política governamental era de não-intervenção. Quando a consciência do público despertou e surgiu por fim uma crescente pressão popular, os governos foram paulatinamente obrigados a assumir as suas responsabilidades, a intervir na economia e a impedir a exploração dos mais fracos. Hoje, a sensibilidade popular com relação à exploração e à degradação do sexo parece ainda pequena, e por isso se exerce tão pouca pressão popular sobre os governantes para impedi-las. É evidente que, enquanto o público não despertar, nada de eficaz se fará para remediar a situação.

 

MATURIDADE E CORRUPTIBILIDADE

 

     Todo este tema é um dos campos do mundo moderno em que a mentira e a insinceridade crescem com maior rapidez. Seremos os adultos tão diferentes dos jovens? Estaremos insinuando que o que pode corromper um jovem de dezesseis anos não corrompe um adulto de trinta e seis ou de cinqüenta e seis? Como se ter ultrapassado o divisor de águas dos vinte e um anos - o que dá uma certa sensação de maturidade - autorizasse a pessoa a considerar-se incorruptível!

 

     É impossível que este tema não comece a preocupar seriamente. É uma questão demasiado evidente e óbvia para que se possa encolher os ombros. Mesmo assim, vez por outra, num país ou noutro, certas comissões governamentais de inquérito ou grupos de trabalho recomendam medidas que, para não dizer que são hipócritas, só podem ser descritas como incrivelmente superficiais. As recomendações, em poucas palavras, reduzem-se a isto: "Censura para os jovens? Sem dúvida! Censura para os adultos? Nunca!"

 

     Por um lado, pede-se urgentemente às autoridades públicas que tomem medidas eficazes para que os nossos jovens possam viver numa atmosfera livre da corrupção causada pela pornografia. Por outro, protesta-se indignadamente contra qualquer medida que se tome no sentido de limpar da mesma corrupção a atmosfera em que os adultos se movem. Por um lado, concorda-se em que a pornografia é uma ameaça à liberdade dos jovens e um perigo para o seu desenvolvimento emotivo e psíquico normal. Por outro, concorda-se igualmente em que a censura é uma ameaça à liberdade dos adultos e um insulto à sua maturidade.

 

     Parece inconcebível que alguém possa defender a sério esta dupla posição. Salta à vista, em primeiro lugar, que na prática é impossível chegar a qualquer resultado útil a partir de tais fundamentos contraditórios. As "liberdades" que os adultos reclamam para si tornarão necessariamente ineficazes os controles que propõem para os jovens. Afinal de contas, jovens e adultos não se movem em dois mundos totalmente diferentes nem as suas "atmosferas" podem ser facilmente separadas na prática. Mas o que é muito mais difícil de compreender é o conceito de homem e de sociedade em que essas proposições parecem basear-se. Postos a buscar-lhe algum fundamento, imagino que será uma destas duas suposições:

 

a) depois de certa idade, ou a partir de um certo nível de maturidade, já não se corre o perigo de ser afetado ou corrompido pela pornografia; ou, então,E

 

b) a partir de certa idade, corromper-se a si próprio ou deixar de fazê-lo é um assunto pessoal.

 

     Consideremos mais em detalhe cada uma dessas suposições.

 

INTELIGENTE? SINCERO? NORMAL?

 

     Creio que é possível adotar a primeira atitude - a de que a idade imuniza contra a pornografia - se desligarmos a nossa inteligência, e neste caso o único remédio eficaz consiste numa espécie de choque terapêutico que faça a pessoa pensar. Já que um dos princípios muitas vezes enunciado (embora nem sempre posto em prática) na sociedade permissiva é o de que só os arrogantes julgam os outros, a minha "terapia", para o tratamento dos casos que estamos considerando é não julgar, mas tentar fazer com que cada um se julgue a si mesmo. Devo acrescentar que não têm faltado ocasiões de praticar esta terapia com os jovens, tanto quanto com os adultos, o que também é bastante lógico, infelizmente. Quando os adultos agem e falam como se a sua "maturidade" os tivesse imunizado de alguma forma contra os efeitos degradantes da pornografia, os jovens (que, para bem e para mal, tendem a imitar os mais velhos) rapidamente assumem a mesma atitude, e apressam-se a afirmar que são igualmente maduros e estão igualmente imunizados. Mas tomemos um caso específico e apliquemos a terapia.

 

     Chega um rapaz ou uma moça de quinze ou dezessete anos e me diz: "Li tal romance ou assisti a tal filme" (reconhecidamente pornográficos), "e realmente não senti nada de muito especial ou perturbador nisso. Não fiquei afetado(a)..." O meu estoque de respostas para essa pseudo-maturidade é mais ou menos o seguinte:

 

     "Bom, certamente não posso julgá-lo. É você que tem de julgar-se. Mas o que posso dizer é que alguém que tenha assistido a esse filme ou lido esse livro, e diga que não se sentiu afetado por ele, não pode ser três coisas ao mesmo tempo. Não pode ser inteligente, sincero e normal, tudo de uma só vez. Pode ser duas dessas coisas, ou possuir duas dessas qualidades, mas não as três juntas". E explico: "Se você, que diz que permaneceu imperturbável diante dessa obra, é normal e sincero - isto é, se você é uma pessoa normalmente constituída quanto à sexualidade, e ao mesmo tempo pensa realmente que me está dizendo a verdade -, então você não é inteligente, não é profundo, realmente não se conhece. Pois essa obra afeta todas as pessoas normais. Logo, essa obra o afetou, sem que você o percebesse...

 

     "É claro que pode não ser este o caso. Há uma segunda hipótese: a de que você seja normal e inteligente; isto é, que você tenha reações sexuais normais e se conheça, mas neste caso não está sendo sincero. Naturalmente, essa obra o afetou, e você o sabe. Mas não me está dizendo a verdade...

 

     "Novamente, esta é uma hipótese que só você pode julgar. Longe de mim fazer qualquer juízo. Você é que sabe. Porque, afinal de contas, há uma terceira possibilidade: você é sincero e inteligente, isto é, você realmente se conhece e realmente me está dizendo a verdade; em outras palavras, essa obra realmente não o afetou... Ora, então você é... Bem, é melhor que você mesmo conclua..."

 

     Mais de uma pessoa teve uma reação indignada: "Espere um pouco, não, isso não!" Ao que replico: "Eu não disse que você o era. Simplesmente apontei as alternativas. É você quem tem de aplicá-las".

 

PSEUDO-MATURIDADE

 

     Mas essas alternativas serão válidas somente para os adolescentes? Nós, os adultos, não somos também capazes de ostentar uma pseudo-maturidade? Até que ponto é preciso desligar a cabeça para poder afirmar que uma pessoa pode corromper-se aos dezesseis, mas não aos trinta e seis anos? Se alguém está realmente corrompido aos dezesseis anos, é de presumir que, com o decorrer dos anos, venha a tornar-se um adulto corrompido. E então o problema será "descorrompê-lo". Ou pode-se pensar que não existem adultos corrompidos ou corruptíveis?

 

     As alternativas - sincero, inteligente, normal - que se aplicam aos dezesseis anos aplicam-se igualmente aos trinta e seis ou aos cinqüenta e seis. O que pensar, portanto, se encontramos hoje em dia muitíssimas pessoas que afirmam ser tão maduras que a pornografia não as afeta? Seria forte, evidentemente, concluir que estamos rodeados de anormais. Mas então seremos levados a concluir que muitas pessoas "maduras" de hoje ou são terrivelmente inconscientes ou são inconscientemente insinceras. A minha opinião pessoal é que provavelmente são ambas as coisas; e por isso gostaria de dizer que as linhas abaixo, embora possam parecer duras, não pretendem ser negativas. Porque foram escritas não só na tentativa de sacudir as pessoas inconscientes e levá-las a pensar, como também na convicção de que, se começarem a fazê-lo, descobrirão a insinceridade da sua própria atitude e começarão a ser sinceras.

 

CONVERTER O PECADO EM VIRTUDE

 

     O mundo adulto moderno, que se orgulha de ser "liberado" e dá graças a Deus (ou talvez apenas a si mesmo) por não ser igual a todas as gerações passadas da humanidade, é culpado não só de um farisaísmo muito mais repelente do que o do fariseu do Evangelho (cf. Lc 18, 9-11), mas também de uma hipocrisia muito pior do que a hipocrisia vitoriana pela qual professa particular desprezo.

 

     Os vitorianos - pelo menos segundo nos dizem - cometiam erros e diziam que não os cometiam. Os permissivistas modernos cometem erros, e dizem que são acertos. O vitoriano pecava e - ocultando o seu pecado - queria que o mundo o considerasse virtuoso. O permissivista moderno peca e - proclamando o seu pecado - quer que o que faz seja visto como virtude. O vitoriano pelo menos sabia o que era o pecado, embora talvez se esforçasse pouco por evitá-lo. O permissivista moderno proclama que o pecado não existe, e assim não tenta evitá-lo nem arrepender-se de nada. Apresenta-se como impecável. É um santo autocanonizado.

 

     Se existe hoje um problema de "credibilidade" entre as gerações, se os jovens freqüentemente têm pouco respeito pelos adultos, é porque a geração mais jovem percebe a hipocrisia, ou pelo menos a falsidade, dessa atitude de tantos adultos com relação à censura: "Censura para os jovens? Sem dúvida. Censura para nós? Que absurdo! Eles são jovens; não podemos deixar que se corrompam. Nós somos maduros, e, portanto, incorruptíveis". Quem pode estranhar que os jovens não tenham senão desprezo pelos defensores dessa dupla moral?

 

O DIREITO DE CORROMPER-SE?

 

     Como sugerimos antes, este duplo critério de moralidade pode basear-se numa outra hipótese sutilmente diferente: não é que os adultos sejam incorruptíveis, mas, se quiserem corromper-se, é um problema que só diz respeito a eles, e ninguém - nenhum indivíduo, nenhuma autoridade pública - tem o direito de interferir.

 

     Esta, pelo menos, não é uma posição moralizante. Os seus expoentes não se interessam pela moralidade. A palavra que têm constantemente nos lábios é "liberdade": "Queremos liberdade. Exigimos liberdade, liberdade de fazer o que bem quisermos. Agora que a temos, que ninguém se atreva a tirá-la de nós".

 

     Podemos fazer dois comentários acerca dessa posição. Um é quanto ao uso da palavra "liberdade". Penso que não devemos dar o braço a torcer às pessoas que proclamam ter descoberto uma nova liberdade, porque não o fizeram. O que descobriram é, na verdade, uma antiga escravidão.

 

     Um viciado em sexo não é mais livre do que um viciado em drogas ou um alcoólatra. Se opta pelo caminho do vício, o problema é dele. Mas não se pode deixar que diga que é o caminho da liberdade. Um homem não é livre quando deixa de governar-se por leis externas, mas quando se autogoverna; quando é senhor de si mesmo. E essas pessoas não se governam a si mesmas; são governadas pelas suas paixões. E a escravidão que vem de dentro é pior do que qualquer escravidão imposta de fora [2].

 

     O segundo comentário diz respeito ao suposto "direito" que a pessoa teria de corromper-se, se assim o quiser. Qualquer um pode certamente corromper-se, se quiser, do mesmo modo que pode roubar, assassinar ou suicidar-se, se o quiser. Mas terá o direito de fazer essas coisas? Certamente que não. Temos os direitos que Deus nos deu, e nenhum outro. Temos o poder de transgredir a sua Vontade, mas não temos o direito de fazê-lo [3].

 

     Além disso, não existem direitos sem deveres. O direito de uma pessoa à vida significa que todos têm o dever de respeitar-lhe a vida. E essa pessoa, a vida dos outros. Tenho o direito de que o meu vizinho respeite a minha propriedade e a minha pessoa. Mas também tenho o direito de que ele se respeite a si mesmo. Ninguém tem o direito de sujar a rua. Ninguém tem o direito de degradar o mundo. Ninguém tem o direito de degradar-se a si mesmo. Nós não somos peças soltas num mundo de peças soltas. O que cada um de nós faz ou é - ou faz de si mesmo - tem um efeito, para bem ou para mal, sobre todos os que o rodeiam. Este é o motivo por que degradar-se a si mesmo é, de algum modo, ofender o resto da humanidade, como também é - num nível muito mais grave - ofender a Deus.

 

PESSOAS COISIFICADAS

 

     A sexualidade é um dom divino, exerce uma função sagrada pela qual o amor humano, no casamento, recebe uma expressão única de união que o associa à criatividade de Deus. A pornografia implica uma degradação essencial dessa realidade sagrada, pois tende a despertar o sexo em função do próprio sexo e não do amor e da procriação. E isso é degradar o seu sentido e o seu papel, reduzindo-o ao nível de um instinto animal cujo único objetivo é procurar uma satisfação sensual imediata. E quando as pessoas dão rédea solta aos seus instintos animais, tornam-se cada vez mais animalescas, e cada vez menos capazes de respeitar-se mutuamente como pessoas.

 

     Num plano mais amplo do que o que estamos considerando agora, não há dúvida de que uma pessoa que não controla os seus apetites ou instintos não pode relacionar-se com os outros de um modo verdadeiramente humano, porque os seus impulsos descontrolados a impedirão de respeitá-los. Usará ou abusará dos outros como objetos, e não os respeitará como pessoas. O capitalista, dominado pela avareza, explorará os seus empregados, ainda que arranje mil razões para justificar a sua conduta. O terrorista, dominado pelo nacionalismo exaltado, pelo ódio cego ou pelo desejo de vingança, seqüestrará, torturará ou matará vítimas inocentes. O fabricante de pornografia ou, mais especialmente, o seu cliente - a pessoa dominada ou obcecada pelo sexo -, explorará igualmente os outros, se puder; porque as outras pessoas só lhe interessarão na medida em que possam satisfazer o seu apetite obsessivo. Nos outros, não verá pessoas, mas apenas objetos, objetos a serem desejados e usados, dos quais possa abusar e depois desfazer-se. O respeito pelos outros tornar-se-á uma expressão sem sentido para a sua mente confusa e uma meta inacessível para a sua vontade enfraquecida e para a sua natureza cada vez mais egoísta.

 

A MULHER PERMISSIVA

 

     O homem permissivo degrada-se a si próprio tornando-se escravo da sua sensualidade. A mulher permissiva pode fazer o mesmo. Mas, com mais freqüência, o seu motivo é simplesmente a vaidade ou a cobiça. Em qualquer caso, é igualmente egoísta, e não menos degradante.

 

     A cobiça é sem dúvida o principal motivo por que algumas mulheres se prestam a ser exibidas como objetos sexuais, pois o normal é que exijam um pagamento - substancial - para se deixarem fotografar para determinadas revistas ou para aparecerem em certos filmes ou shows. Mais curioso, e também muito mais freqüente, é o caso das mulheres - que provavelmente até se consideram "respeitáveis" - que chegam mesmo a pagar (e às vezes quantias altas) para se exibirem como "objetos sexuais". É simplesmente a vaidade feminina que as move, nada mais. Mas às vezes a vaidade feminina é tão má, tão egoísta e tão degradante como a sensualidade masculina. A vaidade de inúmeras mulheres de hoje escravizou-as de tal forma à moda que, pelas roupas que vestem ou pelo comportamento que adotam, parecem convidar os homens - e às vezes forçá-los - a tratá-las como objetos. A sua vaidade - tal como a cobiça da moça que se exibe nas capas das revistas - procura extorquir um tributo da sensualidade masculina.

 

     Antes de deixarmos este assunto, poderíamos acrescentar uma palavra sobre a modéstia - uma virtude feminina do passado, hoje aparentemente esquecida ou desprezada. A modéstia - no modo de a mulher vestir-se ou comportar-se - é simplesmente uma expressão da sua decidida vontade de ser tratada como uma pessoa pelos homens e de não ser rebaixada ao nível de objeto.

 

A AUTOCENSURA

 

     Conforme salientamos antes, os filhos têm direito à lealdade dos pais; nesta matéria, têm direito à sinceridade, ao autodomínio e ao exemplo dos pais. O pai e a mãe que leiam uma obra pornográfica ou assistam a um filme desse estilo, não só ofendem a Deus e se autodegradam, mas violam o direito dos seus filhos a terem pais que possam admirar.

 

     Isto reforça a conclusão de um capítulo anterior: a necessidade da autocensura. A indicação moral prática aqui é que cada um precisa ser o seu próprio censor: ter idéias claras para saber que obras podem deformá-lo ou degradá-lo, e a sinceridade e a força de vontade para evitá-las.

 

     Se os pais vêem que as autoridades públicas pouco fazem para combater a contaminação moral da atmosfera que os seus filhos respiram e na qual crescem, então é a eles próprios que cabe fazer mais. Não podem ter medo de exercer a autoridade com os seus filhos e de ser exigentes com eles. Mas sejamos sinceros. Se os pais realmente amam os seus filhos, e querem protegê-los dos efeitos perniciosos da pornografia, o único argumento eficaz (e o único honesto) é: "Assistir a tal espetáculo ou ler tal obra significa ofender a Deus e autodegradar-se. Logo, não podemos permitir que você veja isso, do mesmo modo que também nós não podemos vê-lo, e não o faremos".

 

A autocensura é simplesmente uma expressão do autocontrole, e o autocontrole é essencial à liberdade social individual [4]. Ninguém sugerirá que o autocontrole é sempre fácil. Mas torna-se muito mais fácil quando a pessoa liga o raciocínio e exercita um pouco o senso comum.

 

           Suponhamos que vou a um supermercado disposto a comprar alimentos e alguma coisa para beber. Suponhamos também que lá se oferecem inúmeros gêneros alimentícios e bebidas que possuem uma aparência apetitosa e um cheiro muito agradável, mas que - como tenho boas razões para admitir - contêm veneno... Que farei? Comprarei outras coisas! Graças a Deus, há muitas outras coisas à venda que também têm um gosto muito bom e são realmente saudáveis.

 

     E se se chegasse a uma situação em que a maioria dos alimentos nas prateleiras estivesse envenenada? Ainda assim, não os compraria. Isso significaria que teria de gastar mais tempo percorrendo outras lojas, mas no fim estou certo de que encontraria algum alimento comestível. E se chegasse a hora em que praticamente todas as coisas parecessem ter um aspecto agradável, mas estivessem envenenadas?... Bem, suponho que teria de produzir o meu próprio alimento. E talvez procurasse alguns outros poucos cidadãos sensatos que estivessem dispostos a unir-se comigo numa cooperativa para a produção de alimentos saudáveis.

 

     E se alguns (ou muitos) dos meus concidadãos não parecessem achar que a comida estava envenenada, e a comessem? E se não parecessem fazer caso dos sintomas decorrentes do envenenamento (embora esses sintomas fossem na realidade fáceis de ver por quem quer que se desse ao trabalho de olhar)?... Ainda assim, não comeria... E se me dissessem que devia deixar de ser antiquado, se se rissem de mim por ser vítima de preconceitos puritanos, se insistissem em que a minha relutância em comer revelava uma falta de maturidade ou uma personalidade não-liberada?... Ainda assim, penso que não me deixaria convencer. Espero que o meu medo ao suicídio provasse ser mais forte do que o meu medo à opinião pública, especialmente a uma opinião pública tão estúpida.

 

     E se a insistência viesse do círculo dos meus maiores amigos: "Vamos lá, rapaz. Não seja um desmancha-prazeres tão grande. Experimente. É uma ótima comida, e o seu gosto é tão bom!"? Provavelmente, responderia: "Não duvido de que seja atraente. Nem duvido do seu sabor (embora desconfie do gosto que depois deixa na boca...). Simplesmente digo que é veneno" (e lembraria que os venenos mais perigosos são aqueles que têm uma ótima aparência e um sabor excelente).

 

     E se um amigo íntimo insistisse comigo em que deveria partilhar com ele dos "quitutes" que tinha acabado de comprar e comia naquele momento? Francamente, se eu visse um amigo (ou qualquer pessoa por quem sentisse um pouco de consideração) bebendo uma Coca-Cola envenenada ou um uísque on the rocks fortificado com arsênico, e não conseguisse persuadi-lo de que estava envenenado, não somente eu me recusaria a bebê-lo, como... bem, inclino-me a pensar que, tendo falhado os argumentos racionais, o que faria em nome da amizade seria arrancar-lhe o copo das mãos e quebrá-lo contra o chão. E se ele protestasse: "Que diabo você pensa que está fazendo? Essa era a minha bebida!", eu lhe replicaria: "Fiz-lhe um favor. Você se estava envenenando". E se não agisse assim - por respeito à liberdade dos outros -, penso que não passaria de um mau amigo. Deus nos livre de amigos liberais cujos princípios os levam a permanecer indiferentes se nos vêem cometer um suicídio inconsciente.

 

PORNOGRAFIA E VENENO

 

     A parábola não necessita de explicação. "O mundo inteiro - disse Shakespeare - é um teatro". Se vivesse hoje, talvez se sentisse tentado a dizer que "o mundo inteiro é um supermercado". E talvez acrescentasse alguns comentários agudos se visse secções inteiras do supermercado repletas de pornografia: o teatro, os romances, os filmes, a televisão, os entretenimentos em geral, a propaganda...

 

     Que fazer quando nos oferecem bens tão tentadores e de qualidade tão duvidosa? Que fazer? Pensar. Será tão difícil?

 

     Oferecem-me pornografia. E então? Mesmo que o meu sentido sobrenatural não me dissesse que comprar, ler, ver ou anunciar pornografia é uma ofensa a Deus que destrói a vida divina na minha alma, o meu senso comum deveria dizer-me que se trata de um veneno para a minha vida natural, que é algo que ameaça matar todas as minhas possibilidades humanas de felicidade, obcecando-me, privando-me da liberdade de amar, tornando-me cada vez mais incapaz de um relacionamento respeitoso com qualquer pessoa do sexo oposto; ou impedindo-me - se essa é a minha vocação - de encontrar um amor duradouro, carinhoso e nobre no casamento.

 

     Se a pornografia é veneno, evito-a. Se isso significa ter que evitar certos espetáculos, programas, romances ou revistas, qual é o problema? Há ainda à minha volta muitíssimas outras obras despoluídas de que posso desfrutar. E se alguém me convidasse a deixar de ser puritano, eu o convidaria a deixar de ser tolo. Não me considero um puritano, mas uma pessoa normal dotada de um mínimo de senso comum. Mas, seja como for, é melhor ser um puritano vivo do que um tolo morto.

 

     Se alguém me mostra uma revista pornográfica, rasgo-a. "Que foi que você fez? A revista era minha!" - "Isso era o seu veneno. Eu lhe fiz um favor. Se você estiver disposto a cometer suicídio, faça-o privadamente e não tente envolver os outros". Não sei se é verdadeira essa curiosa lei segundo a qual o número de tolos é ilimitado, mas há quem pense que a soma total da burrice diminuiria se todos fôssemos tolos juntos, ou que o veneno deixaria de ser letal se conseguíssemos que todos o tomassem. Esquece-se que a história tem visto cidades inteiras serem destruídas pela peste, porque ninguém reparou que se tratava de peste, até que foi tarde demais. Há hoje em dia mais pessoas que vêm sendo destruídas pela peste pornográfica do que todos os que morreram no passado pela peste bubônica.

 

O BOLO ENVENENADO A MEIAS

 

     Dizer: "Não, eu me recuso a assistir a isso", quando se sabe ou se suspeita que a obra em questão ofende a Deus e degrada o homem, dizer isso é que é autocontrole e autocensura. Levantar-se e sair ostensivamente de um espetáculo quando, contra as expectativas anteriores, este começa a tornar-se degradante, isso é que é autocontrole e autocensura.

 

     Talvez convenha acrescentar uma palavra sobre as obras que parecem ser produções de primeira categoria em outros aspectos (enredo, atores, fotografia, etc.), mas que têm respingos de cenas pornográficas, uma camada de açúcar envenenada e totalmente desnecessária, aplicada por cima ou por dentro. Que fazer?

 

     Voltemos ao supermercado, pois a parábola pode uma vez mais ajudar-nos a solucionar o caso. Ali, diante de mim, sobre o balcão, vejo um bolo com uma aparência absolutamente fabulosa; e talvez o próprio gerente me esteja convidando a experimentá-lo, para ver como é delicioso. Mas é a mesma história: estou moralmente certo de que está envenenado, pelo menos em algumas partes. Ergo? Não o como! Não, mesmo que seja de graça! Não vejo nenhuma vantagem em ser envenenado de graça..., embora me pareça absolutamente absurdo pagar para ser envenenado, embora possa ser justamente isso o que tantas pessoas vêm fazendo hoje em dia.

 

     A situação poderia ser diferente se as partes envenenadas estivessem claramente concentradas num ponto, e se alguém (alguém em quem realmente pudesse confiar) me garantisse que essas partes tinham sido efetivamente expurgadas do bolo, e que o resto não oferecia perigo nenhum e era uma delícia digna de um gourmet, absolutamente descontaminada... Neste caso, diante de um bolo completamente expurgado, provavelmente não hesitaria em comê-lo.

 

     A única pergunta é: quem o expurgará para mim? Eu mesmo? Francamente, não estou certo de que possa confiar em mim. Afinal de contas, teria que detectar de algum modo a exata localização das partes envenenadas, o que obviamente requer um paladar sensível ao veneno, a um veneno de sabor agradável; requer, principalmente, uma habilidade especial para descobrir quando se está passando das partes boas para as partes envenenadas, o que inevitavelmente envolve mastigar um pouco as partes envenenadas. Este é justamente o momento em que temo enganar-me e, com um: "Ah, não pode ser mau, e tem um sabor tão agradável...", ir em frente e engolir o bolo inteiro; e depois ter de pagar as conseqüências todas.

 

NADA A PERDER?

 

     A verdade, repito, é que não sei com segurança até que ponto posso confiar em mim mesmo. Descontaminar um bolo envenenado exige realmente um paladar muito sensível para reconhecer o momento de parar, além de uma vontade muito forte para ser capaz de fazê-lo; ou talvez exija simplesmente uma total imunidade ao veneno. Eu certamente não possuo essa imunidade. E embora pense ter a necessária sensibilidade de paladar, não posso garantir a força da minha vontade. De modo que, se é preciso expurgar o bolo, prefiro que outro o faça por mim. (Embora deva acrescentar, como desabafo, que não posso deixar de pensar que a vida seria muito mais simples se os produtores de bolos tomassem mais cuidado com a extraordinária quantidade de veneno que vêm introduzindo na massa).

 

     É assim que eu encaro esses filmes ou romances de sucesso, com as suas uvas passas e as suas camadas de açúcar pornográficas, com essas cenas desnecessárias que se intercalam por pura "liberalidade" do produtor ou do autor, como acréscimos "gratuitos". Se eu não encontrar alguém que faça (ou, na realidade, desfaça) a "limpeza" por mim (Ah, que saudades daquele velho benfeitor com pele de elefante, o censor público!), receio que tenha de ir tomar as refeições a outra parte.

 

     Sinto muito, meus amigos; mas, se desconfiar de si mesmo ou ter medo de correr um risco desnecessário é sinal de imaturidade e de uma mente não liberada, prefiro que me classifiquem como uma pessoa decididamente imatura e desesperadamente não-liberada. O meu consolo é que pelo menos estou aqui, ainda vivo.

 

     James Baldwin, o escritor norte-americano, fala em algum lugar do perigo que representa para a sociedade ter no seu meio pessoas que "não têm nada a perder". Acho que tenho muito a perder; ou, com a graça de Deus, muito a ganhar. Mas para não perder a liberdade, ou a alma, é essencial compreender que podemos perdê-las, e saber reconhecer e evitar aquelas coisas que podem privar-nos delas. Em 1965, durante o 25 aniversário da Batalha da Inglaterra, alguém perguntou a Ginger Lacy, o ás número um da RAF dos combates aéreos de 1940, como tinha sobrevivido, e de que qualidades um piloto de caça precisa para sobreviver. A sua resposta foi incisiva e clara: "Sobrevivi porque tinha muitíssima sorte. A sorte é a principal qualidade de um piloto de caça. Além disso, você precisa ter um medo bom e saudável, ou acabará por matar-se. Conheci companheiros que não tinham medo, e que estão mortos há vinte e cinco anos".

 

     A autocensura é simplesmente uma expressão do autocontrole. E o autocontrole e a vigilância são essenciais se se quer sobreviver. Por que haverá tantas pessoas hoje em dia que não exercem o autocontrole? Será que pensam que o perigo não existe? Será que não querem sobreviver? Será que pensam que não têm nada a perder? Ou nada a ganhar?

 

     Impõe-se ainda uma outra pergunta diante dessas pessoas que nunca perscrutam o céu, nem sonham com possíveis perigos, nem acreditam no veneno que vêm ingerindo há anos: Estarão mesmo vivas? Não estarão mortas? A esta pergunta, somente Deus pode responder, e talvez elas mesmas. Era nelas que o autor inspirado pensava quando escreveu: Conheço as tuas obras: tens nome de vivo, mas estás morto [...]. Lembra-te de como recebeste e ouviste a doutrina. Observa-a e arrepende-te. Se não vigiares, virei a ti como um ladrão, e não saberás em que momento te surpreenderei (Apoc 3, 1-3).

 

OS CORAÇÕES DOS PAIS

 

     Não temer pela própria sobrevivência - que loucura! Não temer pela sobrevivência dos filhos - que inconsciência, ou que crime e desumanidade! E voltamos ao espetáculo espantoso de tantos pais de hoje que parecem contemplar com total indiferença a exploração e a destruição da vida dos seus filhos, e que às vezes até contribuem para essa destruição iludindo-se a si próprios, praticando a "dupla moral", não negando a si mesmos, por egoísmo e fraqueza, nada daquilo que os seus filhos deveriam deixar de ler ou de ver.

 

     Terá morrido completamente o amor desses pais pelos seus filhos? Penso que não. Penso que simplesmente adormeceu, ou foi posto a dormir. Pode, portanto, ser despertado. Mas quando virá esse despertar?

 

     Neste contexto, muitas vezes vem à minha mente uma frase com que São Lucas descreve a futura missão de João Batista, o Precursor. Diz que reconduzirá os corações dos pais aos filhos (Lc 1, 17). Não será este o problema de hoje: pais que não amam suficientemente os seus filhos e cujos corações não estão suficientemente voltados para eles? Uma conversão dos corações dos pais - é disto que os jovens do mundo de hoje necessitam.

 

     Se os pais realmente voltarem os seus corações para os filhos, compreenderão imediatamente de que modo podem ser modelos para eles. Compreenderão a necessidade de ser sinceros e exigentes consigo próprios, exercendo o autocontrole, negando-se a ver ou ler muitas coisas que os atraem, persuadidos de que essa sua firmeza é uma fonte de fortaleza para os filhos, e de que lhes estão dando um exemplo de verdadeira maturidade humana e de amor cristão - um exemplo que os filhos podem respeitar e imitar.

 

     Se os pais realmente voltarem os seus corações para os filhos, compreenderão a exploração criminosa a que os filhos estão sendo submetidos. E com o despertar do amor paterno e materno, haverá um despertar da opinião pública, uma revolta de indignação moral e - finalmente - uma pressão genuína, popular e em massa sobre as autoridades públicas, para que remedeiem os abusos da atual situação.

 

OS ABUSOS DA CENSURA?

 

     O controle estatal não é suficiente para deter a decadência moral do nosso mundo. Somente o autocontrole pode fazê-lo. Mas o controle estatal também é necessário, porque sempre haverá pessoas que não estejam dispostas a exercer o autocontrole. Sempre haverá pessoas inescrupulosas dispostas a alcançar fama e fortuna através da exploração sexual. E essas pessoas têm de ser contidas.

 

     Se, como já vimos, há um direito público à limpeza das ruas e a uma atmosfera despoluída, e uma correspondente obrigação por parte das autoridades públicas de conter os que causam a contaminação física, há iguais direitos e deveres com relação à contaminação moral.

 

     Portanto, a menos que se queira ser cúmplice na exploração dos jovens (e dos não tão jovens) e na corrupção geral da sociedade, não há alternativa a não ser apoiar e reivindicar alguma forma de censura pública responsável. Estaremos mais convencidos das nossas reivindicações - e seremos mais convincentes -, se não nos deixarmos enganar ou cegar pela cortina de fumaça que a propaganda anticensura promove tão eficazmente hoje em dia...

 

     A censura, como se costuma dizer, está sujeita à manipulação, ao patrulhamento político, ao abuso... Sem dúvida. Mas - já o demonstramos amplamente - o mesmo acontece com a liberdade. Poderei até concordar com a pessoa que grita: "A liberdade é melhor do que a censura", desde que ela concorde comigo em que os abusos da liberdade são piores do que os abusos da censura. E os abusos da liberdade são excessivos e visíveis por toda a parte, e causam danos incalculáveis à personalidade e à humanidade de milhões de pessoas, ao passo que os abusos da censura são infinitamente menos freqüentes e, sobretudo, afetam ou prejudicam muito poucos, e esses fundamentalmente nas suas contas bancárias.

 

     Além disso, não estou disposto a aceitar o contraste implicado na tese de que "a liberdade - mesmo quando envolve alguma pornografia - é melhor do que a censura". A pornografia é censura, na medida em que significa silenciar e suprimir consciente e deliberadamente outros aspectos do sexo mais nobres, mais importantes e mais humanos do que o aspecto meramente animal e físico. Ou seja, um governo que não enfrente a sua responsabilidade de censor da pornografia está, na verdade, censurando a liberdade, está ameaçando e limitando a liberdade que as pessoas têm de ser donas de si próprias, de evitar uma imaginação excitada e obcecada, de se respeitarem a si mesmas e aos outros, de amar e de ser felizes.

 

INCOMPETÊNCIA GOVERNAMENTAL

 

     Não se pode evitar a impressão de que alguns governos de hoje renunciaram absolutamente ao seu dever de regular estas matérias. A sua irresponsabilidade parece, em certos casos, basear-se numa tal ignorância da natureza humana que os deveria tornar totalmente desqualificados e incompetentes para governar.

 

     Como julgar certos países em que o governo lança uma campanha massiva contra o fumo, e ao mesmo tempo legaliza o aborto e aprova leis cada vez mais permissivas sobre o sexo? Será que não compreende que a saúde moral de uma pessoa - a própria fibra do seu caráter - é muito mais certeiramente debilitada pela pornografia do que a saúde do seu corpo pode ser prejudicada pelo cigarro?

 

     É verdade que algumas autoridades - como a francesa - criaram uma espécie de sobretaxa para filmes e espetáculos pornográficos. Mas, perguntamos, espera-se a sério que essa assim chamada "censura econômica" seja uma medida preventiva? É provável que venha a deter os espetáculos pornográficos? Ou não significará simplesmente que, para compensar essa sobretaxa, o público terá que pagar mais para ver esses espetáculos? Que tipo de preocupação governamental revela isso? É possível que estejamos alcançando o cume da ironia política: afinal de contas, os governos, até agora, geralmente têm reivindicado o direito de prender as pessoas que não pagam os seus impostos. Agora parece que vão prendê-las - lançá-las na escravidão moral - por pagá-los...

 

SEXO: UM ASSUNTO PRIVADO

 

     Os governos ocidentais podem estar sendo sinceros na sua preocupação pelo bem-estar dos seus cidadãos. O problema é que parecem não compreender exatamente que implicações e exigências esse bem-estar traz consigo. Que pode haver de mais desastroso para uma sociedade do que deixar o poder de governar nas mãos dos que não sabem qual é a finalidade desse poder?

 

     A finalidade de um governo é, naturalmente, procurar o bem-estar público ou bem comum. Mas não se atinge o bem comum apenas no momento em que o Produto Nacional Bruto ou a renda per capita crescem, ou em que a população goza de um bom serviço de saúde pública ou de um bom serviço de correios. Alcança-se o bem comum quando um governo cria e defende condições em que os homens podem viver como homens, e isso significa proteger tudo o que favoreça a dignidade pessoal e humana, e impor restrições aos que pretendem degradar ou explorar os outros, tanto econômica como - o que é mais importante - moralmente.

 

     A responsabilidade governamental vem-se limitando à administração de coisas e já não abrange o desenvolvimento das pessoas. Os políticos de hoje são, na sua imensa maioria, filósofos econômicos. Têm uma idéia econômica do homem, mas não têm uma idéia humana da economia. E por isso não têm uma idéia realmente humana - centrada no homem - das sociedades que devem governar.

 

     Somente um governo desprovido de uma genuína filosofia do homem poderia consentir com a tese aparentemente simples (propugnada por liberais ingênuos ou por marxistas não tão ingênuos) de que o sexo é um assunto privado, no qual nem os governos nem as leis têm o direito de intervir...

 

     A tese é aparentemente simples, mas é também demonstravelmente falsa. Pois o sexo, conforme vimos, é uma área de especial fraqueza humana - e portanto, aberta à exploração inescrupulosa -, e ao mesmo tempo constitui, quando descontrolado e especialmente quando explorado, uma força que paradoxalmente tende à violência e à destruição da paz social. Certamente existem aspectos privados no sexo; mas o sexo explorado e descontrolado não é um deles.

 

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[1] Mesmo dentro do casamento, o uso da sexualidade - se se quer manter a sua nobreza e subordinação ao amor - requer controle e restrições. Onde faltam essas restrições, o sexo, longe de servir ou de fomentar o amor, tende a destruí-lo, transformando-se numa expressão de egoísmo.

[2] Naturalmente, alguns rejeitarão o conceito de "viciado em sexo", ou a idéia de que o sexo corrompe ou escraviza. Também o viciado em drogas e o alcoólatra dizem que não são viciados, que simplesmente gostam de bebidas ou de drogas. Não discuto com pessoas assim; elas precisam é de ajuda. Mas se não o reconhecerem, não se deixarão ajudar. Os Alcoólatras Anônimos enunciam esta verdade da vida com muita clareza.

     Outros dirão até que, se as pessoas preferem a pornografia, na verdade não estão sendo exploradas: estão alcançando o que escolheram. Certamente; mas o que escolheram é a exploração, ainda que talvez não o percebam. Grande parte da exploração consiste precisamente em manipular os explorados, incutindo neles a idéia de que estão escolhendo a liberdade, quando na realidade estão escolhendo a escravidão. Quando os fabricantes de pornografia puserem cartazes nas fachadas dos seus estabelecimentos com os seguintes dizeres: "Loja para escravos"; "Oferecemos escravidão: uma escravidão atraente, até cativante, mas escravidão", então, mesmo que ainda possamos chamá-los exploradores, já não poderemos chamá-los hipócritas.

     O mesmo acontece com os marxistas, que continuaremos a chamar hipócritas enquanto continuarem a manipular a palavra "democracia". Pode-se imaginar algo menos democrático do que a filosofia ou a tática marxista, ou do que o Estado comunista? Portanto, teremos de continuar a chamar hipócritas aos marxistas enquanto não pararem de se dizer democratas. Quando os marxistas deixarem de falar em democracia e disserem claramente: "O que nós oferecemos é um paraíso terreal em que os homens nascerão, serão educados, alimentados, postos a trabalhar, tornados socialmente úteis, e por fim enterrados higienicamente e inteiramente esquecidos depois, sob o controle ditatorial de um Estado de partido único, em que cada um será tratado a cada momento como uma unidade estritamente econômica e nada mais, em que as necessidades materiais elementares serão satisfeitas, mas em que não permanecerá nenhum vestígio de liberdade política ou pessoal..."; quando os comunistas disserem isso, nós continuaremos a dizer que os seus programas são tão errados e tão vazios como sempre, mas já não diremos que são insinceros. O mesmo se aplica aos fabricantes de pornografia.

     Uma situação pior do que a do cego que guia outro cego é a do cego que engana outro cego: a do cego que cega outro cego... A verdade é que ninguém está qualificado para falar sobre sexo a não ser que reconheça as suas contradições: a sua nobre função, quando está integrado no plano de Deus; mas também o seu potencial escravizante, quando se descontrola ou é explorado.. Os escritores, artistas, produtores de filmes, editores de revistas e publicitários de hoje conhecem muito bem esse potencial e os lucros que lhes traz. O problema é que o público a que se dirigem muitas vezes parece não querer reconhecê-lo.

[3] Ora, a Vontade de Deus é que sejamos felizes (a sua Vontade é a nossa felicidade), e se a transgredimos, não poderemos sê-lo.

 

[4] Afinal de contas, se uma pessoa não exerce o autocontrole, com toda a certeza estará sendo controlada por outros. Este controle ou manipulação da maioria por uma minoria, especialmente por meio do sexo, cobre campos e interesses muito mais vastos do que se poderia imaginar à primeira vista. Já falamos dos fabricantes comerciais de pornografia e do seu interesse em quebrar a resistência à compra que os seus eventuais clientes possam ter. Não pensemos, contudo, que sejam eles os únicos a ter um claro interesse em promover a pornografia. No mundo comercial em geral, notam-se nos nossos dias acontecimentos muito significativos. O uso de um certo elemento de sex appeal na propaganda comum sempre foi algo normal a que ninguém nunca sonhou opor-se. Belos rostos enfeitaram com sorrisos os anúncios de viagens em diligência no século passado, e enfeitam com sorrisos os anúncios de viagens aéreas neste. Nos últimos anos, porém, isso degenerou em muitos casos em pornografia direta e progressiva. Por quê? Se a degeneração é devida a uma inadvertência por parte das empresas em questão (que apenas se estariam deixando manipular ingenuamente por alguns publicitários profissionais), a sua ingenuidade seria verdadeiramente espantosa. Resta a possibilidade de que se trate de uma política deliberada: determinados fabricantes teriam percebido que é mais fácil vender (e vender qualquer coisa) a pessoas sem autocontrole, e por isso favorecem tudo o que destrua esse controle. Não é uma possibilidade agradável.

     Também não se pode descartar essa desagradável possibilidade na esfera da política. Quando assistimos a determinados programas políticos favoráveis à liberalização das leis de censura, etc., chegamos a duvidar se a idéia-mestra da cabeça dos políticos "liberais" que patrocinam esses programas não será a de pôr em prática um duplo efeito manipulador: por um lado, o de caçar votos, pois as pessoas caem facilmente nas promessas de uma liberdade fácil; e, por outro, o de enfraquecer a população, tornando-a (ao menos, no entender de alguns) mais governável. Alguns políticos liberais estão bem conscientes - ainda que os seus eleitores não o estejam - de que as sociedades permissivas que vão gerando se parecem cada vez mais com o planejado e manipulado Admirável Mundo Novo de Huxley. Chegam até a superar os Controladores Mundiais de Huxley na habilidade com que sustentam a ficção da liberdade.

     A realidade, porém, é que estão errados ao pensar que a sociedade liberalizada seria mais facilmente controlável (pelo menos por meios democráticos); tais sociedades, na verdade, conduzem inevitavelmente a uma violência e anarquia social crescentes, e no final só podem ser governadas pela pura força policial, o que simplesmente salienta o objetivo último dessas políticas calculadas para destruir a própria humanidade da vida das pessoas.